quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Pensamentos sobre o Treino orientado para as Capacidades Individuais

Olhamos para o Treino orientado para o Indivíduo como um suplemento de estímulos NeuroMotores sobre o jogador que podem facilitar o processo de melhoria ou mesmo aprendizagem de determinado comportamento táctico-técnico.

Na busca de um entendimento mais profundo sobre uma metodologia de treino específica que enfatiza o treino “mais” individual, já por duas vezes tivemos a oportunidade de estarmos presentes nos “Youth Diplomas” promovidos pelo Coerver Coaching, em Portugal.

Se é verdade que na sua génese o Coerver Coaching era demasiado analítico e descontextualizado, com as “melhorias” que obteve com Hugo Vicente, essa metodologia tornou-se bem mais adequada à complexidade que o jogo admite em si.

Contudo, algumas reflexões de investigadores e/ou cronistas, têm indicado que o processo de aquisição de skills técnicos segundo uma perspectiva mais individual, é fraco e desadequado. Julgamos que essa ideia surge, em especial, quando neste “tipo” de treinos se assiste a um reportório de exercícios onde o jogador está ecologicamente isolado, com o seu foco atencional somente investido nele próprio, nos cones e na bola.

Ou seja, se olharmos para o processo de treino mais individualizado em que o sucesso da tarefa seja o de conduzir bem a bola por entre um conjunto de cones, é natural que a aprendizagem global do jogador se foque apenas e só na sua própria condução. Neste caso, o sucesso da tarefa está completamente desconectado à interpretação que o jogador tem sobre aquilo que o rodeia, não promovendo sobre ele a necessidade de adaptação ao contexto de jogo – neste caso, colegas, adversários, balizas...

Contudo, o processo de treino que se orienta para o desenvolvimento das capacidades individuais não se resume ao jogador contornar meia-dúzia de cones. Ele próprio se pode orientar por princípios, etapas e objectivos que permitem ao jogador enquanto indivíduo ser mais forte quando incorporado no colectivo.

Sobretudo nas idades mais precoces, acreditamos que o processo de treino deva ser focado numa visão mais individualista. Que estimule a criança a desenvolver a sua relação com bola. Que permita à criança ter uma bagagem táctico-técnica em que a bola lhe seja uma solução e não um problema.

A experimentação de comportamentos na relação individual jogador-bola por parte da criança, poderá oferecer-lhe uma estimulação dos padrões motores básicos relacionados como seu drible, passe ou remate, que o jogo formal demora mais a oferecer. Da mesma forma, julgamos que só quando se respeita o mínimo de aleatoriedade que o jogo acolhe e se adopta uma abordagem pedagógica não-linear é que o processo de treino orientado para o indivíduo é eficaz.   

Nem todos os treinadores de formação têm ao ser dispor mini-Cristianos ou mini-Messis. Muitas crianças (e cada vez mais) chegam aos clubes com uma literacia motora extremamente limitada, implicando muitas vezes que se tomem estratégias de treino que se orientem para um fragmentismo indesejado mas infelizmente necessário.

Como poderemos nós ensinar uma criança realizar um passe, se ela nem sequer tem um controlo NeuroMotor sobre o seu corpo que lhe permita diferenciar a parte interna ou externa do pé? Como poderemos nós ensinar a recepção em contexto de jogo se para a criança a recepção consiste em pisar a bola em andamento? Como podemos nós promover uma boa relação com bola à criança, se ela nem sequer lhe acerta quando a quer dominar, passar ou conduzir?

O mesmo se passa em jogadores mais velhos que necessitem de desenvolver/aperfeiçoar determinados comportamentos. Como poderá um avançado desenvolver o seu jogo aéreo se passa uma semana de treinos sem rematar uma vez de cabeça? Como pode um extremo desenvolver o seu 1v1 se passa uma semana de treinos sem ter de encarar os seus adversários dessa maneira? Como podem os médios-centros desenvolver o seu passe longo, se nos treinos são “obrigados” a jogar curto?

Estas nossas dúvidas, tornam-se ainda mais evidentes se admitirmos que o processo de treino de muitos clubes do interior se resume a dois treinos semanais, e onde apenas está presente um treinador.

Julgamos ser imperativo que o processo de treino no futebol seja específico. Que se operacionalize segundo uma visão sistémica dos diferentes momentos de jogo. Que se baseie no modelo de jogo adoptado pelo treiador(es). Mas poderão os jogadores ficar a perder se tiverem uma suplementação prática orientada para o desenvolvimento dos seus próprios atributos táctico-técnicos?


A nossa resposta é não…

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