segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Significados da não-continuidade do SC Mêda no Nacional de Juvenis!

A equipa de juvenis do SC Mêda não irá participar na fase de manutenção do campeonato nacional da mesma categoria. Esta “ilustre desconhecida” equipa não tem condições humanas para conseguir disputar a segunda fase da Série B do campeonato nacional de juniores B, sendo que a mais cruel das decisões foi tomada. Depois de muita ponderação por parte da direcção, a ausência de um número suficiente de jogadores para continuar em prova, ditou a sua não continuidade.
Defensores do Futebol segundo um olhar global, transversal e total deste Fenómeno, olhamos para esta não-continuidade de uma forma muito triste. Sobretudo, porque o que nos custa mais ao olhar para esta decisão é vermos que foi um grupo de jovens jogadores de uma humilde cidade do interior, que mais afectado foi com esta escolha. E, sobretudo estes jovens, não mereciam sofrer esta consequência.
Antes de mais, importa contextualizar aquilo que foi a génese desta equipa.

Na época 2014/2015, os Sub17 do SC Mêda, comandados pelo excelente treinador Rogério Afonso, foram campeões da categoria na Associação de Futebol da Guarda, elevando-se com mérito próprio para o campeonato nacional. Dos vários jogadores da equipa, apenas 4 (+1 iniciado) continuaram no plantel, tendo todos os outros subido de escalão. Como é óbvio, e por mais qualidade que apresentassem os jogadores vindos da equipa de iniciados, os novos Sub17 não poderiam contar apenas com “eles próprios”, tendo o recrutamento de novos jogadores entrado em marcha.
Para se ter uma noção do que é a realidade do interior do país, quase todos os clubes da AF Guarda não conseguem ter todos os escalões etários representados nos campeonatos regionais. No princípio da época, os clubes têm que ponderar muito bem em quais escalões se inscrevem, fazendo verdadeiros truques de gestão para que as suas equipas se mantenham minimamente competitivas.
Estamos, portanto, a falar de uma questão de quantidade (ou falta dela) de jogadores disponíveis. Pode-se, com isso, ter uma ideia do que é que o recrutamento por parte de uma equipa superior, poderá causar numa equipa inferior.
Por outro lado, é difícil compreender como é que uma equipa da AF Guarda tenha sido colocada na Série B, junto das equipas da AF Porto e AF Aveiro Norte, não jogando contra nenhuma equipa dos distritos limítrofes. Embora seja uma experiência quase, ou mesmo, única jogar contra clubes como FC Porto, Paços de Ferreira, Boavista e companhia, a verdade é que em termos competitivos, o SC Mêda fica sem grandes chances de poder sequer disputar um resultado.
Foram mais de 1900km que o clube fez só para ir jogar fora (mais outros tantos para regressar a casa). São quilómetros a mais para uma equipa que tem a sua deslocação mais curta a cerca de 189km de distância…
Por isso, não deixa de ser curioso que o Tondela, que ficou classificado em 2º lugar da Série C do nacional de juvenis, apenas tenha ganho ao SC Mêda por 2x1, num amigável de início de temporada.

Após várias abordagens a jogadores referenciados pela equipa técnica, o plantel acabou por ser formado por 23 jogadores. Para além da cidade da Mêda, os concelhos de V. N. de Foz Côa, Moncorvo, Trancoso e Aguiar da Beira cederam alguns jogadores a esta equipa. Se bem que destas e de outras localidades como a Guarda, houvessem jogadores bastante interessantes que acabaram por não aceitar fazer parte deste grupo.
Contudo, cedo começaram a sair jogadores. Após o terceiro jogo, um já tinha “abandonado” o projecto. E com o decorrer da época iam-se somando as desistências, chegando a equipa a apresentar apenas 13 jogadores no seu último jogo fora, frente ao Gondomar.
Para se ter uma ideia daquilo que foram as dificuldades de operacionalização do processo competitivo, um dos defesas-centrais habitualmente titulares foi guarda-redes até à época anterior! E em alguns dos jogos que ele não jogou a titular, 4 dos 5 defesas – se contabilizarmos o guarda-redes, eram Sub16!
Até o próprio processo de treino foi muito diferente daquele que é o ideal para o nível competitivo de uma Nacional. Para se ter uma noção, após o início do ano lectivo, esta equipa apenas fazia/faz dois treinos semanais. Metade daqueles que fazem os seus adversários. Dividindo espaço/exercícios com a equipa de juniores do clube.
Enquanto que aos clubes de top desta série mais 1000 ou menos 1000 euros não interferiam em muito no rendimento dos seus jogadores, o mesmo não aconteceria no caso do SC Mêda. Com uma certa ajuda financeira, a equipa poderia, por exemplo, dormir fora para minimizar o efeito negativo das grandes viagens; ou incrementar a sua reduzida equipa técnica.
É cada vez mais difícil criarem-se projectos ambiciosos nestes meios provincianos. Ou são extremamente circunstanciais e pontuais e se concretizam a curtíssimo prazo, ou acabam por desaparecer por falta de consolidações estruturais. O comodismo, descompromisso, visão/postura rígidas e retrógradas para com esses projectos, não permitem que se avance tanto como o potencial do próprio projecto o poderia antever. Embora a participação no campeonato nacional fosse uma oportunidade única para os jovens da região, havia algo que fazia antever que com o decorrer da competição muitas dificuldades iriam surgir na operacionalização do processo competitivo.    Mais do que culpabilizar A, B ou C por esta não-continuidade, é importante que todos os agentes desportivos olhem para o Futebol de um ponto de vista holístico e sistémico entendendo aquilo que são e que foram as dificuldades Desportivas, Técnicas, Sociais, Culturais e Económicas para os Sub17 do SC Mêda.
E aceitem que esta decisão foi a mais acertada para o desenvolvimento dos jovens jogadores, que corriam o risco de pouco Aprenderem num contexto competitivo e, infelizmente, tão desnivelado.
Por estas e outras dificuldades, acreditamos que, ao contrário do que foi dito por Ricardo Silva, guarda-redes da equipa Sub17 do FC Porto, esta equipa não era assim tão “muito fraca”! Embora não achemos que devam ser tratados como “coitadinhos”, deveriam ser mais respeitados por todos os agentes desportivos, tendo em conta o seu contexto mais humilde. Se isso acontecesse por parte de quem manda no futebol, todos sairiam a ganhar.

Por fim, esta não-continuidade da equipa do SC Mêda tem ainda um sabor mais amargo em termos pessoais. Por termos feito parte activa desta equipa (na qualidade de treinador-adjunto) e termos de pôr de parte o nosso próprio processo de aprendizagem, é ainda mais custoso vermos esta equipa “morrer”…

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