segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Uma reflexão sobre as ideias de Fabregas - o "Fisiquismo" do Talento

«Hoje em dia é mais difícil para um jogador talentoso ter sucesso. Não sou forte a nível físico, não sou o mais rápido, não sou o mais forte, pelo que tenho de tentar estar à frente de outro modo. Sei que para ter sucesso hoje em dia é preciso ser muito forte, correr muito e isso não é fácil. O futebol está a mudar e cada dia que passa vemos menos talento e mais poder físico»


Quando se compara o futebol do presente com aquele que era jogado há alguns anos atrás, saltam à vista determinados factos que parecem abordar uma tendência evolutiva do Jogo.

Uns mais relacionados com a dimensão táctico-física do Jogo, como o aumento das distâncias percorridas pelos jogadores, o incremento do número de jogos realizados por época e até a alteração morfológica dos jogadores. Outros, mais orientados para a dimensão táctico-estratégica, como a exponenciação da zona pressing em determinados processos defensivos, ou a eficácia e eficiência dos princípios e sub-princípios de posse em determinados Jogares como por exemplo o do “tiki-taka”.

Até mesmo sobre as equipas técnicas que compõem as equipas de futebol, estamos a assistir ao aparecimento ou consolidação de novas funções. Uma vez mais, conectadas sobretudo ao físico e ao estratégico do Jogo, como o são respectivamente os recuperados físicos e os analistas (e não observadores, que a nosso ver são  cargos diferentes).

Se olharmos para estes factos de uma forma mais linear e menos sistémica, poderemos dizer que o Futebol estará a caminhar num trilho muito próspero, de elevada qualidade com os jogadores a serem cada vez melhores atletas, orientados cada vez mais por inputs tecnológicos, que permitem aos jogadores apresentarem-se com uma eficácia de prestação quase comparada a um ser mecânico…

Mas será que os factos não reclamam outra análise? Acreditamos que sim.

Aquilo que Fabregas chama de “talento” está a ser relegado para um plano secundário. A arte, o romântico, o humano do Jogo parecem estar a ser menosprezados por quem o comanda. Tanto ao nível da formação como no futebol profissional. São precisamente equipas que mostram essas valências aquelas que mais nos apaixonam enquanto aficionados. São jogadores como Cristiano Ronaldo (no início da sua carreira), Messi, Quaresma, Neymar, Di Maria, que nos brindam com o seu talento que nos fazem apaixonar diariamente pelo Jogo.

Embora reconheçamos que só com uma boa organização colectiva o talento individual poderá emergir, é o TALENTO dos jogadores que mais parece estar estagnado na perspectiva evolutiva do Jogo.

Reconhecemos a importância da evolução de determinados parâmetros comportamentais dos jogadores e das equipas. Mas se o Futebol evoluiu na tal dimensão física e estratégica porque não evolui também na dimensão mais táctico-técnica? Porque é que ainda é tão difícil vermos jogadores a top serem exímios no último passe? Porque é que determinadas fintas 1v1 só ainda existem no YouTube? Porque é que quando vemos um golo de “pontapé de bicicleta” ou um  passe “de letra” ainda ficamos tão admirados? Porque é que ainda vemos jogadores a top tão limitados com o seu pé-fraco? Porque é que há guarda-redes que quando têm a bola nos pés se atrapalham tanto com ela?


Num futebol cada vez “mais forte, mais rápido e mais alto” tem que haver obrigatoriamente espaço para o TALENTO. Se não houver, deixaremos de lhe chamar Futebol.